terça-feira, 1 de julho de 2008

Baianidade em série

- E ai, nego! Colé a boa?

- Antártica, fulêro. Vou corcovear.

- Có foi? Fulêro é você, sacana! Feche uma grade comigo?

- Ainda é hoje, vei. Fique na sua que ninguém te bole... ói, você é meu e o boi num lambe! Vou cá, bóra?

- Vá lá. Depois a gente troca essa idéia, moral. Pegue na minha!

- Lá ele! Vai se f...



Só faltou uma frase pra você ficar sabendo do que se trata: Opaí ó!


Ora que o filme virou mini-série! Verdade, sim. Já começaram as filmagens das primeiras cenas do enredo que todo mundo no Brasil já conhece, e que encanta a nós baianos em especial. Mas que baiano não se encantaria. Ver nas telonas o nosso jeito, nosso sotaque, nossas manias, mandingas, que se tornam imperceptíveis no dia a dia, mas que pularam aos nossos olhos quando projetadas no cinema. Além de Lázaro Ramos no papel de Roque e de todo o elenco nativo do filme, teremos Mateus Nachtergaele integrando o elenco na mini-série (imagina João Grilo, Cintura Fina a moda baiana...)!


Sei que alguns pensariam: Isso já é demais. É a exploração do comercial do comercial do comercial! O filme foi feito apenas pra vender bilhetes, um amontoado de improvisos sem sentido e razão de existir. Tanto estereótipo que fico tonto. É um escracho que só tinha como fim vender ingressos mesmo...


A esses eu digo que não. Opaí ó, que é baseado em peça homônima do Bando de Teatro Olodum, representa a essência da nossa baianidade, já retratada nos livros do amado Jorge (veja Capitães de Areia, Jubiabá... leia Jorge Amado). Os improvisos só constatam essa nossa veia cômica. Nosso povo é alegre, festivo (e não apenas festeiro), simples, e deliciosamente negro. A nossa graça é essa e acontece, brota sem fazermos força. Os estereótipos fazem parte de qualquer produção de comédia que pretenda atingir o grande público. Porém ninguém poderá dizer que não existem personagens como aqueles do filme zanzando pela nossa Salvador. Como freqüentador esporádico do Pelourinho, principal locação do filme e também da mini-série, vejo os fiéis evangélicos e católicos, os filhos de santo, os vagabundos, as fofoqueiras, os travestis, os bêbados, as crianças de rua, e mais, as suas conversas que são exatamente iguais às do filme.


Eu mesmo conheço uma pessoa que poderia perfeitamente integrar o elenco do filme e da série. Trabalha comigo, é do bairro da Liberdade, uma linda negra de longas tranças, “uma negra cheia de ranço” como ela mesma costuma dizer, minha amiga Carla. Acho que todo mundo da Cidade da Bahia conhece alguém que se encaixa em algum personagem do filme. Se não conhece, precisa andar mais pelas ruas de nossa capital e começar a gozar da beleza de ser baiano.


O que eu realmente espero da série é que se faça ainda mais latente as discrepâncias sociais que existem por cá, as desigualdades entre ricos e pobres, a relação bi polarizada entre as religiões ditas negras e as judaico-cristãs em face do sincretismo religioso, o preconceito de cor, credo e classe social, a relação do baiano com o turista (e tem mais), a força de nossa musicalidade em nossa cultura, a questão da exploração sexual, exploração do comércio de drogas, dos menores abandonados, questões reais, questões humanas, soteropolitanas.


Se a série conseguir passar todas as questões citadas (e olha que tem muito mais coisa) para o grande público, todo mundo vai ficar sabendo por que a gente fala Opaí-ó com tanto gosto.